11 May 2006

Não sei...

Não sei bem o que foi que me deu ontem. Não me lembro do caminho, não sei por onde fui, lembro-me de luzes, de carros, de árvores e de alcatrão. Sei que não estava sozinha, lembro-me de ouvires vozes, ao longe, não os entendia. Sei que havia música, sei que me foi isso que me levou para um mundo que havia já algum tempo não visitava. Não senti saudades dele. Mas fui lá parar. Acho que foi da música, uma qualquer música que tocava na altura, não me lembro qual. Trouxe de volta a saudade, a solidão, a carência e o vazio. Dei-me permissão para chorar. Ou não me contive. Já não sei. Talvez tenha achado que ia ajudar. Havia muito tempo que não me permitia chorar por estas razões. Há muito sufocava. Talvez me tenha sentido segura, ali, na parte de traz daquele carro, sozinha. Sozinha mas protegida. Eles não tavam longe. "Bebi demais, porra". Qualquer coisa me pesa no peito, doi. As luzes destorcidas pelas gotas daquela água salgada que se formava nos olhos. De certa forma tudo fica mais bonito. Lembro-me. Fiz o caminho que horas antes tinha feito a pé, não foi? Tudo tão vazio agora. Tudo tão parado. Tudo tão só. Abandonado. Só nós, aquele carro. "Estou bem aqui, já passa". Vai ficar tudo bem. Um dia. Lembro-me da ponte. Alguém falou para mim. Foi para mim não foi? Não sei quem foi, não sei o que disse. "Porque fazes isto? Não mereço." Lembro-me das luzes. Lembro-me de querer parar, querer sair. Ficar de pé. ali, a sentir aquele cheiro. Lembro-me dos reflexos das luzes no rio. Como antes reflectiam nos meus olhos. A dor passou. O peso no meu peito fez-se leve. De novo alcatrão. Não vejo mais aquele rio, aquela ponte. Mais luzes. Sem reflexos. Frias. De novo música. Mais uma música. É diferente mais o efeito é o mesmo. Ainda não passou. As luzes ganham reflexos outra vez. Mantenho o silencio. Não quero incomodar. Perco o controlo, as lágrimas fugiram-me. "Vai ficar tudo bem. Não é já, não vai ser fácil. Mas vai ficar tudo bem". Semáforos. "Devemos estar a chegar". Limpo a cara. Uma frase acorda-me definitivamente: "Escosta aqui senão vais dar uma volta enorme". Inspira. Está tudo ok. Sorriso. "Telemóvel, máquina fotográfica, cigarros, esqueiro". Beijo. "Bebi demais"...

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