23 February 2010

Quando nascemos a nossa funcionalidade é nula. Somos totalmente dependentes de terceiros. Não temos a capacidade de sobreviver sozinhos - alias, não a temos durante largos anos - não temos a capacidade de nos alimentar sozinhos, não temos a capacidade de nos proteger sozinhos, não temos sequer a capacidade de nos expressar sozinhos.
Com o passar do tempo vamos ganhando a nossa independência, passo a passo. Começamos com coisas mais simples e mais básicas. Primeiro ganhamos necessidade, fome, sono, mimo, protecção. Depois aprendemos a expressar a nossas necessidades. Por fim, aprendemos a encontrar as nossas necessidades, a satisfaze-las sozinhos. Aprendemos a ir ao frasco das bolachas, aprendemos a ir sozinhos à casa de banho, aprendemos a correr para os braços de alguém ou a manipular alguém para nos pegar ao colo.
Com o passar do tempo criam-se novas necessidades, estimulação, aceitação social, satisfação pessoal, reconhecimento. Uma serie de necessidades mais complexas e mais difíceis de atingir ou mais desafiantes. Necessidades das quais nunca dependemos de terceiros e com as quais aprendemos a lidar, desde sempre, sozinhos. Quando essas necessidades não são satisfeitas sabemos exactamente como lidar com elas, porque as enfrentamos sozinhas desde sempre. O verdadeiro problema surge quando uma daquelas necessidades básicas deixa de estar satisfeita e nos esquecemos da forma como a tínhamos conseguido enfrentar sozinhos.
Quando nascemos, mesmo mesmo no inicio das nossas vidas, quando ainda não sabemos distinguir a fome do sono ou do frio a única reacção que temos é o medo, o pânico, a insatisfação, a tristeza. Nessa altura aprendemos que haverá alguém que saberá como nos acalmar dando-nos aquilo que nos faz falta. Com o passar do tempo, quando já conseguimos expressar as nossas necessidades e pedi-las, ainda há alturas em que somos assaltados pelo mesmo medo, pânico, insatisfação ou tristeza. É nessa altura que desenvolvemos uma capacidade que se provará extremamente importante na nossa vida, a capacidade de nos tranquilizarmos, acalmarmos, sozinhos. Uma coisa a que os ingleses tão inteligentemente chamaram de self-soothe.
Eu perdi essa capacidade. E é uma sensação devastadora.

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