27 October 2010
Mudança de ares
Hoje abriu-se a porta ao outono por aqui! Era tempo de mudança. Agarra-se o laranja das folhas e o vermelho do sol e mistura-se tudo numa nova força para encarar o mundo. Quente. E vivo.
23 October 2010
E se eu começasse a escrever um livro? Daqui a uns anos estava rica!
Colocou a chave na porta e inspirou fundo durante 3 segundos enquanto pensava na calma que queria encontrar por trás daquela porta. O dia tinha-a derrotado e precisava de alguma paz e tranquilidade. Assim que abriu a porta o gato cumprimentou-a com a meiguice que só um gato sabe, fugindo-lhe por entre as pernas para o corredor, para explorar aquele pequeno mundo que era a entrada e o elevador. Já nem se dá ao trabalho de o chamar, é um gato, voltará quando precisar de alguma coisa. Vai à cozinha pousar o saco do pão e por o leite a aquecer antes de pousar a carteira. O mundo lá fora tinha-a fragilizado e precisar de uma grande caneca de leite com chocolate para a aconchegar. Aquece sempre o leite mais tempo nestes dias, para o sentir cair no estômago como uma paixão assolapada. Só então entra no quarto. Pousa a carteira e todos os restantes apetrechos que juntou nas restantes horas. Olha para as botas novas, ainda na caixa, ao canto. Tem de arranjar uma ocasião para as usar. Retorna à cozinha. Apetece-lhe encher-se de pão com manteiga, matar a gula, mas rende-se ao fiambre. Vingar-se-à no chocolate que atira às colheradas para dentro do leite. Resiste, à força, a enfiar uma colher daquele pó directamente na boca, como fazia quando era pequenina. Lembra-se como às vezes, engasgado-se, lhe saía pelo nariz numa sensação horrível e cómica. O gato voltou e mia, desolado, por causa do cheiro a fiambre que paira no ar. Quem o ouvisse diria que não como à dias, coitado do bicho. Enquanto abre o pão pergunta-se se o telemóvel terá tocado. Se alguém lhe terá mandado um email. Anda demasiado vidrada em tecnologias e redes sociais. Parece que é o único contracto amigável que consegue manter com o mundo. É o mais fácil também. Basta contar umas piadas e fazer uns quantos comentários despropositados. Mais tarde volta para ver se houve reacções.
Entra no quarto com a caneca e o prato na mão. A cama ainda está por fazer, é sempre assim quando está sozinha e não espera companhia. Nunca percebeu o propósito de tal coisa. Liga a televisão e pousa o prato sobre o teclado do computador portátil, ainda ligado a tirar da net os últimos episódios de um conjunto de séries que acompanha semanalmente. O gato já se atirou para cima da cama a espera ansiosamente a oportunidade de se fazer ao fiambre.
-Ladrão. Vais lá para fora que a dona quer comer sossegadinha, tá bem?
Fala com ele enquanto o pega ao colo, como se ele percebesse alguma coisa do que ela diz. Ele encosta o focinho à sua bochecha e ronrona de mimo. Ela não deixa conquistar e fecha-o do outro lado da porta, onde começa a protestar em miados agudos e persistentes.
Na televisão dá mais uma série repetida. Nem se dá ao trabalho de mudar. Só quer um bocadinho de companhia para o lanche. O som da televisão ao fundo bloqueia o inicio dos sentimentos de solidão. O lanche é acompanhado pela actualização das redes sociais, email, meteorologia e afins. Pensa no que vai fazer para o jantar. Não tem fome portanto não faz sentido pensar nisso agora. Logo se verá.
Volta à cozinha para arrumar a loiça e trazer o gato para a sua beira. Ele ainda reclama atenção e fa-lo até ser pegado ao colo. Atirou mais um biblot ao chão durante a sua ausência. Um calhau trazido pelo pai numa viagem de negócios sabe-se lá onde. No chão ficou uma marca de dor no soalho de madeira. A parede também levou por tabela e tem uma marca na tinta. Nem se dá ao trabalho de reagir, pega apenas na pedra e coloca-a de novo na beira da janela.
Está a precisar de um banho. O frio que se faz sentir lá fora não foi suficiente para evitar uma mancha de suor na pequena corrida que fez antes de voltar para casa. Mas a preguiça instalou-se quer deitar-se na cama um bocadinho antes de passar aos rituais de higiene.
Há meses que não desliga o cérebro. Sente-se perdida na sua própria vida. Perdeu-lhe as rédeas. Multiplicam-se as vezes que se deixa estar a vegetar na cama, à espera que algo de novo e entusiasmante lhe surja na vida. Cansou-se da luta e do pensamento positivo. É algo que vem e vai na sua vida. Sente-se instável e inconstante. Foi assim a sua vida toda. Mas ultimamente anda pior. Enervada. Impaciente.Olha para o telemóvel, imóvel e quieto na beira da mesa. Tem de ligar o despertador. Tem de dormir cedo. A vida presenteou-a com este emprego que de quando a quando a tira da cama às 2h30 da manhã. Logo hoje, que queria sair. Sair com as botas novas e uma saia bem curta. Sabe-se lá se não era hoje que se ia cruzar com alguém interessante. Com algo fresco e entusiasmante. Lá no fundo sabe, se não tivesse de acordar cedo estaria agora a multiplicar-se em desculpas para não ir a lado nenhum. É sempre assim. Anda imóvel e inerte perante a vida. Deixa-se ficar, ao sabor da corrente. Falta-lhe a força e determinação para remar de encontra àquilo que quer. Remar para algo novo, diferente. Melhor ou pior. Senta-se energicamente na cama como a força de quem vai mudar o mundo, sabe que tem de agarrar a vida pelos cornos e tomar-lhe a rédea. Depois enterra-se mais fundo na almofada e deixa-se ficar.
Colocou a chave na porta e inspirou fundo durante 3 segundos enquanto pensava na calma que queria encontrar por trás daquela porta. O dia tinha-a derrotado e precisava de alguma paz e tranquilidade. Assim que abriu a porta o gato cumprimentou-a com a meiguice que só um gato sabe, fugindo-lhe por entre as pernas para o corredor, para explorar aquele pequeno mundo que era a entrada e o elevador. Já nem se dá ao trabalho de o chamar, é um gato, voltará quando precisar de alguma coisa. Vai à cozinha pousar o saco do pão e por o leite a aquecer antes de pousar a carteira. O mundo lá fora tinha-a fragilizado e precisar de uma grande caneca de leite com chocolate para a aconchegar. Aquece sempre o leite mais tempo nestes dias, para o sentir cair no estômago como uma paixão assolapada. Só então entra no quarto. Pousa a carteira e todos os restantes apetrechos que juntou nas restantes horas. Olha para as botas novas, ainda na caixa, ao canto. Tem de arranjar uma ocasião para as usar. Retorna à cozinha. Apetece-lhe encher-se de pão com manteiga, matar a gula, mas rende-se ao fiambre. Vingar-se-à no chocolate que atira às colheradas para dentro do leite. Resiste, à força, a enfiar uma colher daquele pó directamente na boca, como fazia quando era pequenina. Lembra-se como às vezes, engasgado-se, lhe saía pelo nariz numa sensação horrível e cómica. O gato voltou e mia, desolado, por causa do cheiro a fiambre que paira no ar. Quem o ouvisse diria que não como à dias, coitado do bicho. Enquanto abre o pão pergunta-se se o telemóvel terá tocado. Se alguém lhe terá mandado um email. Anda demasiado vidrada em tecnologias e redes sociais. Parece que é o único contracto amigável que consegue manter com o mundo. É o mais fácil também. Basta contar umas piadas e fazer uns quantos comentários despropositados. Mais tarde volta para ver se houve reacções.
Entra no quarto com a caneca e o prato na mão. A cama ainda está por fazer, é sempre assim quando está sozinha e não espera companhia. Nunca percebeu o propósito de tal coisa. Liga a televisão e pousa o prato sobre o teclado do computador portátil, ainda ligado a tirar da net os últimos episódios de um conjunto de séries que acompanha semanalmente. O gato já se atirou para cima da cama a espera ansiosamente a oportunidade de se fazer ao fiambre.
-Ladrão. Vais lá para fora que a dona quer comer sossegadinha, tá bem?
Fala com ele enquanto o pega ao colo, como se ele percebesse alguma coisa do que ela diz. Ele encosta o focinho à sua bochecha e ronrona de mimo. Ela não deixa conquistar e fecha-o do outro lado da porta, onde começa a protestar em miados agudos e persistentes.
Na televisão dá mais uma série repetida. Nem se dá ao trabalho de mudar. Só quer um bocadinho de companhia para o lanche. O som da televisão ao fundo bloqueia o inicio dos sentimentos de solidão. O lanche é acompanhado pela actualização das redes sociais, email, meteorologia e afins. Pensa no que vai fazer para o jantar. Não tem fome portanto não faz sentido pensar nisso agora. Logo se verá.
Volta à cozinha para arrumar a loiça e trazer o gato para a sua beira. Ele ainda reclama atenção e fa-lo até ser pegado ao colo. Atirou mais um biblot ao chão durante a sua ausência. Um calhau trazido pelo pai numa viagem de negócios sabe-se lá onde. No chão ficou uma marca de dor no soalho de madeira. A parede também levou por tabela e tem uma marca na tinta. Nem se dá ao trabalho de reagir, pega apenas na pedra e coloca-a de novo na beira da janela.
Está a precisar de um banho. O frio que se faz sentir lá fora não foi suficiente para evitar uma mancha de suor na pequena corrida que fez antes de voltar para casa. Mas a preguiça instalou-se quer deitar-se na cama um bocadinho antes de passar aos rituais de higiene.
Há meses que não desliga o cérebro. Sente-se perdida na sua própria vida. Perdeu-lhe as rédeas. Multiplicam-se as vezes que se deixa estar a vegetar na cama, à espera que algo de novo e entusiasmante lhe surja na vida. Cansou-se da luta e do pensamento positivo. É algo que vem e vai na sua vida. Sente-se instável e inconstante. Foi assim a sua vida toda. Mas ultimamente anda pior. Enervada. Impaciente.Olha para o telemóvel, imóvel e quieto na beira da mesa. Tem de ligar o despertador. Tem de dormir cedo. A vida presenteou-a com este emprego que de quando a quando a tira da cama às 2h30 da manhã. Logo hoje, que queria sair. Sair com as botas novas e uma saia bem curta. Sabe-se lá se não era hoje que se ia cruzar com alguém interessante. Com algo fresco e entusiasmante. Lá no fundo sabe, se não tivesse de acordar cedo estaria agora a multiplicar-se em desculpas para não ir a lado nenhum. É sempre assim. Anda imóvel e inerte perante a vida. Deixa-se ficar, ao sabor da corrente. Falta-lhe a força e determinação para remar de encontra àquilo que quer. Remar para algo novo, diferente. Melhor ou pior. Senta-se energicamente na cama como a força de quem vai mudar o mundo, sabe que tem de agarrar a vida pelos cornos e tomar-lhe a rédea. Depois enterra-se mais fundo na almofada e deixa-se ficar.
09 October 2010
Caiu-me a ficha
Tornei-me uma pessoa banal e desinteressante. Não reconheço a pessoa que sou ou as coisas que digo. As barbaridades saem-me pela boca fora, incontroladas e sem nexo. Sinto-me um desenho animado. Fora de controlo.
Houve um dia em que eu soube o que era. Houve uma altura em que eu soube que era uma boa pessoa. Incomum. Original. Dedicada. Divertida. Espirituosa. Meiga. Gentil. Não reconheço a pessoa que me olha ao espelho. Não lhe reconheço o medo e o rancor nos gestos e nas palavras. Tornei-me rígida. Intolerável. Seca. Tão ávida de algo novo e interessante que não o reconheceria se estivesse mesmo à minha frente. Estou fechada para o mundo. Não o aceito e não o tolero. Tornei-me azeda. Como um copo de leite abandonado durante dias e dias ao sol. Abandonaste-me. E eu abandonei o que fui. Para me tornar em algo que não gosto e não quero ser. Mas ainda faltam as forças. Os dias pesam e prolongam-se na ausência de mim e de nós. Permanece apenas a vontade de me enrolar numa bolinha e me deixar ficar sobre a cama.
Maybe tomorrow I'll buy the ticket. Maybe.
Houve um dia em que eu soube o que era. Houve uma altura em que eu soube que era uma boa pessoa. Incomum. Original. Dedicada. Divertida. Espirituosa. Meiga. Gentil. Não reconheço a pessoa que me olha ao espelho. Não lhe reconheço o medo e o rancor nos gestos e nas palavras. Tornei-me rígida. Intolerável. Seca. Tão ávida de algo novo e interessante que não o reconheceria se estivesse mesmo à minha frente. Estou fechada para o mundo. Não o aceito e não o tolero. Tornei-me azeda. Como um copo de leite abandonado durante dias e dias ao sol. Abandonaste-me. E eu abandonei o que fui. Para me tornar em algo que não gosto e não quero ser. Mas ainda faltam as forças. Os dias pesam e prolongam-se na ausência de mim e de nós. Permanece apenas a vontade de me enrolar numa bolinha e me deixar ficar sobre a cama.
Maybe tomorrow I'll buy the ticket. Maybe.
Subscribe to:
Posts (Atom)